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POESIA COLABORATIVA
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sábado, 16 de julho de 2011

O quintal de tia Libina - ou - Manga verde com sal

Nas férias, o quintal de tia Libina era o céu deste mundo: Um pé de goiabas quase sempre bichadas – afinal nem o paraíso é perfeito – duas bananeiras gigantes que nos alimentavam no café da manhã, um pé de caju que completara doze anos de idade sem nunca nos dar um misero e azedo cajuzinho.

- Paciência, paciência. Cada um tem seu modo de se desenvolver no tempo. Cada árvore é única. Se não deu este ano é porque não era o tempo de dar. Vamos esperar mais um pouco, que aí quietinho ele não esta incomodando ninguém. Dizia minha tia, sempre que alguém a aconselhava derrubar o cajueiro.

Tinham também algumas flores que nunca decorei o nome e umas ervas que minha tia usava pra nos fazer chá quando abusamos dos doces e nos contorcíamos com dor de barriga. Tinha também lá no fundo, bem pertinho do muro, a maior mangueira que alguém poderia desejar. Nem baixa, nem alta. Tinha o tamanho certo. Não era suficientemente alta de modo que não pudéssemos colher sem perigo algumas mangas e nem tão baixa a ponto de não haver frutas intocáveis, que só de pirraça a natureza fez parecerem ser as mais bonitas e mais cobiçadas. Até as árvores brincam de fazer charme!

Meu companheiro de brinquedos na casa de tia Libina era Paulo. Um primo um pouco maior do que eu, que gostava de exibir suas habilidades acrobáticas, subindo com destreza nos galhos mais altos da mangueira, enquanto eu me esforçava em não cair e quebrar um braço.

Paulo e eu passávamos as tardes explorando aquele quintal-paraíso, brincando com todas as fantasias possíveis de serem imaginadas. Mas no fim da tarde, sem nunca faltar, acabávamos trepados em nossa mangueira, nos empanturrando de seus frutos deliciosos.

Paulo tinha um gosto que eu sempre achei esquisito, mas que era a preferência de toda casa. Ele gostava de chupar manga verde com sal. Escolhia as mangas mais robustas, com a casca mais lisinha sem nenhuma marca ou sinal de defeito, cujo verde quase amarelado chegava cintilar. Cortava um pedaço gordo da manga, passava-o no sal e com prazer e com careta devorava duas, quatro, seis, até oito mangas enquanto eu ainda estava no terceiro ou quarto fruto. É que gosto de chupar a manga toda, comer as cascas e sugar bem o caroço o que demanda mais tempo do que simplesmente cortar e devorar.

Outro dia Paulo apareceu por aqui, tinha visitado tia Libina e me trouxe um fardo de mangas verdes. Me pediu o sal, me contou dos seus flertes e amores e debochou do meu relacionamento com a mulher que embora ele chame de velha tem nossa idade. Ele queria me convencer de que gostoso mesmo era comer manga verde com sal. Coitado, ainda não sabe o sabor de uma fruta madura.



Um comentário:

  1. "Me contou dos seus flertes e amores e debochou do meu relacionamento com a mulher que embora ele chame de velha tem nossa idade."

    "Ele queria me convencer de que gostoso mesmo era comer manga verde com sal. Coitado, ainda não sabe o sabor de uma fruta madura."

    Talvez ele tenha pensando o mesmo do primo;

    "Ele queria me convencer de que gostoso mesmo era comer fruta madura com mel. Gosto é gosto e vi em seus olhos dizendo que sou coitado. Ele ainda não sabe que cada um tem seu modo de se desenvolver no tempo? Cada árvore é unica. Eu sou único e não sou obrigado a ter os mesmo gostos dele. Talvez um dia eu tenha vontade de experimentar o sabor de uma fruta madura, tudo muda acontece que por enquanto o que me dá sabor são as mangas verdes."

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