O que há pra hoje?

POESIA COLABORATIVA
Suor. Espaço de exercício poético e livre escrita...

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Fragmentos de memória e montante de saudade. Para Mãe Lenita, com amor!




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Parece que foi anteontem o dia em que eu, já nos idos dos meus vinte anos, adentrei timidamente a residência daquela senhora de aparência frágil e andar vagaroso. A casa tinha o teto rebaixado, paredes caiadas de amarelo, portas e janelas de madeira, simples, porém não menos acolhedora e aconchegante.




Logo, na chegada, me apresentei, disse minha graça e o que me levava até ali. Fui breve, queria mesmo era fazer o ontem ser hoje, o agora, àquela hora...e fomos reviver, ela, o passado límpido de sua vida, e eu, o mundo que desejava habitar e que o tempo me era nada generoso.


Lá estava, na sala, dona Silvanira Freitas Gravatá, ou mais adequado para sua missão neste mundo: Mãe Lenita, sentada num sofá de encosto alto e macio, coberto por uma manta de retalho dos mais coloridos e estampados; o piso parecia ter sido lustrado pra noite de gala, para um baile ou para visita há muito esperada; Da estante de madeira torneada saltavam porta-retratos, eram as revelações primeiras - antes de uma palavra, sequer -, sobre quem são todos aqueles que figuravam naquelas fotografias. Tudo adequadamente em seu lugar, num esmero revelador.


Na ocasião, pesavam sobre seus ombros e pés (únicas partes do corpo que reclamavam algum incomodo) 90 anos, com margem de erro para alguns anos a mais. No tempo dos seus pais, registrar menino era luxo pra pouca gente, era dificultoso, carecia procurar cartório e testemunhas; quando era possível registrar, sendo isso alguns anos depois dos nascimentos das crianças, havia transcorrido tanto tempo que nem mesmo quem gerou guardava o ano da rebentação. Ficava o dito pelo não dito, e ia toda prole de cinco, oito ou mesmo dez meninos, com anos de diferença, registrar no mesmo dia. Daí a controvérsia entre ter nascido em 1915 ou em 1908.


Também estava na sala uma mulher bonita, garbosa, de pé, na soleira da porta, entre a sala, qual estávamos, e a cozinha, sempre a auxiliar mãe Lenita em suas incursões pelo passado, relembrando um fato ou colocando em sua boca as palavras encobertas pelas tramas do tempo. Mais pessoas ocupavam o ambiente das quais não me recordo muito bem, mas sei que estavam lá, ouvindo a tudo atentas e receptivas. Mesmo para elas, que conviviam com aquela senhora de muitas histórias, parecia-lhes estranho tantas perguntas e curiosidades de um menino imberbe que chegara como quem viesse buscar notícia de um ente que mora longe e pouco se comunica. Eram muitas as histórias a serem desfiadas naquela tarde quente de primavera.


Não me ative às controvérsias da idade, Isso pouco me interessava, bastava mesmo era sua memória estar viva, poder falar, ter paciência para tanta aporrinhação de um jovem conversador e cheio de curiosidades. E teve, como teve, me surpreendi com tamanha generosidade, riquezas de detalhes e parcimônia. Mansidão e cuidados que só as avós carregam sobre o semblante de labutas, mas também de realizações.


E falando em labutas e batentes, a vida não foi tão fácil para esta senhora negra e de origem humilde. Nascida em família de poucas posses e marcada pela dor da escravidão, aportara neste mundo pelas bandas de Maracás, ali permanecendo entre seus familiares por pouco tempo, logo fora levada para Amargosa e, de lá, para Areia, hoje, Ubaíra, ali o destino lhe reservava mais partidas, outros caminhos e outra família, sendo esta de patrões, o que não lhe tirava o mérito dos cuidados e da orientação. Através dela chegara às terras das cabrucas do cacau, por intermédio do senhor Patrício R. Teixeira e da senhora Edith C. Teixeira, pais de uma grande personalidade no Direito, na literatura e na política: Euclides Teixeira Neto, com quem cultivou duradoura amizade e compadrio.


Quando chegou pelas bandas de Tesoura estava aos 15 anos de idade, já experimentada pelas andanças entre Maracás, Amargosa e Areia. Morou, por pouco tempo, acompanhando a família Teixeira, em Barra do Rocha, mas logo retornando à Tesouras na expectativa de “fazer seu terreno” trilhando um percurso próprio. Criou asas, voou caçando jeito de dar rumo à sua própria vida.


E se fez independente, casou-se como senhor Uilson, constituiu família e aos 25 anos deu inicio à sua missão: ser parteira, dona das mãos que por seu intermédio vieram ao mundo 2.100 (dois mil e cem) meninos, gente que hoje campeia em nosso torrão, em São Paulo, Brasília, Rio de janeiro, Belém do Pará e até no exterior, como ela mesma dizia sobre seus rebentos de suor, devoção e aflição. São eles das mais variadas profissões: advogados, médicos, soldados, engenheiros, professores etc...ali desvendava-se o mistério de tantas fotografias ordenadamente dispostas em sua estante de madeira torneada. Também cozinhava, era dela o tempero mais requisitado nos lautos jantares na Loja maçônica e nas casas dos doutos donos de anéis e diplomas.


Exerceu durante muitos anos a função de enfermeira prática, acompanhando os doutores: Rito, Anísio, Nelson e Aristóteles, cabendo-lhe a função de parteira, mas sempre sabendo dos seus limites, “até onde dava pra eu ir, eu ia” disse-me afirmando suas limitações, já que não houve tempo para o estudo; a escola, sonho confessado nas horas de conversa, ficara aplacada na memória como prostrada num altar repleto de luzes e delírios, sonhos tolhidos para os que ainda hoje trazem na tez a força da África, e não da senzala, como insistem alguns tantos por ai. Mesmo faltando o diploma e o anel pra ornar-lhe o dedo, era ela quem fazia exemplarmente o que muitas vezes cabia aos médicos, e sem cobrar nada por isso, aliás, nunca cobrou por nenhum parto que fez!


Em seus cadernos de anotações, os que restaram após furto em sua residência, constavam os nomes de boa parte da gente que ajudou a nascer. Constavam também as datas dos nascimentos e outras informações julgadas como dignas de notas. Ela fez questão de me mostrar estes cadernos repletos de datas e nomes. Lembro que fui tomado por forte emoção, ali constavam nomes de muitas crianças, todas nascidas vivas e saudáveis por vossas mãos.


Perguntada sobre quais procedimentos eram usados para realização dos partos, ela respondeu: “Comigo era assim...eu tratava como se fosse o médico, viu, porque minha experiência era...vinha assim como uma intuição que eu tinha. Eu tinha uma intuição de fazer como fazia, eu mesmo não sabia como era, “num” era?...vinha aquela intuição então eu fazia...quando vinha a criança, quando a criança era homem, quando era “mulé” era “pêra” uma intuição que eu tinha, se fosse bom e se fosse ruim, eu tinha intuição, se fosse pra mim, se fosse pra o médico, eu tinha aquela intuição. Então, graças a Deus fui muito feliz durante os tempos que peguei “minino”, eu fui muito feliz, viu! Deus me protegeu, nunca teve nada nas minhas mãos, nunca aconteceu nada comigo, graças a Deus!”


E foi assim em todos os 2.100 (dois mil e cem) partos feitos por esta filha de Nanã e Ogum: pela intuição, pelo cuidado e amor ao próximo, pela sensibilidade e respeito à energia que entornava este ato sagrado. Nunca pôs em risco a vida dos bebês tampouco das parturientes.


Mulher de fibra, solidária, alegre e festeira. Nos carnavais antigos, aqueles que não voltam mais, cordão de caboclo igual ao seu não existia; ela reunia um grupo com homens, mulheres, crianças e, fantasiados de entidades das matas, serpenteavam pelas ruas da cidade, entoando músicas, lamentos, chulas e puluxias. Dançava, sambava, rodava, reverenciava as entidades indígenas e africanas, tudo com muita vivacidade, entusiasmo e respeito.


Seus carurus espalhavam gente por todos os cômodos da casa, indo parar até na rua. A casa era pequena pra tanta gente que ia se deliciar com seus quitutes e entoar os estribilhos da reza que antecipava a comilança. Em tempo de natal, seu presépio era a coisa mais linda de se ver, fazia questão de reservar o primeiro quarto da casa para sua montagem. Era imponente, primoroso, uma montanha de onde se equilibravam imagens sagradas e outras nem tanto, mas que cumpriam com a função de referência e devoção. Chegou um tempo que o conservava impecável o ano inteiro, ela resolveu, por motivos que não me ficou totalmente esclarecido, não desmontá-lo. Só sei que este presépio possuía uma função de altar de penitências, reverências e dedicação ao culto sagrado do menino Jesus e das suas entidades mágicas.


E os partos, as festas: Cordão de Caboclo, caruru, presépio/altar... tudo isso foi se perdendo no tempo com a idade avançando e o corpo pedindo repouso, decerto que muita coisa ainda permanece viva, como tudo que até agora relatei e que jamais morrerá, porque enquanto houver história, memória e palavra, existirá a vida dessa grande mulher que há pouco nos deixou.


Partiu quase no esquecimento de uma cidade inteira, já que não morava mais pelas bandas de Ibirataia (e mesmo quando por lá morava as visitas eram poucas), pois precisou ausentar-se da cidade que lhe fez mulher e mãe de vasta prole; ali, na pequena cidade incrustada entre dois rios e altos morros cobertos do que de mata restou, não havia quem lhe reservasse o cuidado e dedicação; fora morar em Eunapólis aos cuidados de parentes e lá subiu aos céus, tranquila, como todos os justos e bons de coração. A vida lhe foi generosa, não lhe dera riquezas materiais, mas lhe deu dois mil e cem filhos, dignidade e vida longa (104 anos).


Hoje, tomado pelo saudosismo e tristeza trazidos pela notícia de sua ausência eterna, rabisco essas breves linhas como um neto que dedica seus poemas à avó e, talvez, as palavras, quaisquer que sejam elas de amor ou gratidão, não sejam capazes de dizer o que realmente senti ao me deparar com aquele ser de aparência frágil e de alma e coração gigantes. Mas é preciso partir do princípio das palavras para compartilhar com você, leitor, o meu encontro com ela, e que as mesmas não podem dizer com precisão e olhos marejados, mas servirão como canal de contato e aproximação!




Mãe Lenita, que Olorum te guie e proteja sempre. Axé!

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Ainda é cedo

Espera um pouco, benzinho! Ainda é cedo!
Espera um tico, benzinho! Um pouco mais!
Espera a hora, benzinho, a boa hora!
Espera na ciranda da espera que não acaba nunca mais!

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Não quero TV

Não quero TV!
Não quero TV!
Não quero!

Eu quero poder!
Eu quero poder!
Eu quero poder descansar!

Me deixa te ver!
Me deixa te ver!
Dançando.

Dançando sem som,
o som de quem soa,
sem saber soar.

Sem saber soar!

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Acerca das Intensidades

Se você não é capaz de ser intenso, de ser inteiro...
Se você não pode se permitir colocar o amor na frente...
é porque a ribalta apagou, a cortina fechou, a platéia sumiu, e você ficou sozinho olhando, do bastidor, o teatro vazio.

- O espetáculo já acabou! Você não viu! Deixou escapar a deixa. Quem sabe na próxima temporada?!.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Para deixar satisfeito: "Serei perjuro"

Quer que eu jure?
É isso? É só isso?
Tá certo, eu juro.
Pronto, eu juro.
Acabou?

O "H" do Mundo


Hoje eu acordei com um nó cego na garganta.
Com os olhos marejados sufoquei uma dor fina, aguda, com os soluços e os espasmos que o medo do choque com o mundo novo provoca.
E não é só porque sofro assim que quero me matar, é também porque o mundo está uma merda e para todo lado para o qual se olhe só se vê devastação.
É isso. Devastado é como se sente meu peito.
Que vontade niilista de explodir tudo e começar do zero, ou de nem recomeçar.
Que vontade grande de dizer umas verdades, de mostrar minha versão de tudo e pintar o mundo de monstro. O mundo é um monstro sereno, atencioso, educado, bondoso, que à todos cativa. Mas eu cansei e não caio mais nessa falácia, nessa embromação.

sábado, 11 de fevereiro de 2012

E quanto aos senhores policiais?





Foi bastante curioso observar como a polícia lidou com os mesmos ataques que a sociedade civil lida sempre que se engaja numa ação contestadora ao Estado

Opressão social; o ataque da contra-informação lançado pela mídia a fim de marginalizar o movimento diante da opinião pública, amedrontar os militantes e confundir as ações do movimento; a opressão armada das forças militares; a coação legalista com ameaças de prisão e por fim o corte de salário e a ameaça de exoneração; são armas há muito tempo usadas pelos agentes do poder  independente do rótulo partidário que estejam usando.

Bem vindos! Vocês que achavam que o titio Estado manteria relações amistosas com vocês –afinal sois seu braço armado- viram a truculência, as ações discricionárias e a força de opressão que os agentes do poder são capazes de lançar contra qualquer um que os conteste.

E olhe que suas reivindicações eram estritamente de interesse de sua categoria, reivindicações conciliatórias e meramente salariais  que em nada questionavam suas condições de trabalho e os moldes de sua intervenção na sociedade.   

As conquistas de uma mobilização estão para além dos acordos e gratificações que os militantes recebem como cala a boca. Talvez a maior conquista desta greve, senhores, foi  demonstrar a todos o tamanho da força política desta categoria. Que outra categoria em greve conseguiria a paralisação e imobilidade social que conseguiu a polícia militar da Bahia? Quem mais conseguiria este feitio?


Não ficamos inseguros - a polícia nunca nos foi nenhuma garantia de segurança, sejamos honestos -, sentia-mo-nos indefesos, o que é diferente. Em nome da "indefesidão" fizeram-se especulações,arrastões, assaltos, roubos, latrocínios, homicídios e crimes de toda ordem. Houve até quem sempre tendo mantido regime de retidão e obediência a lei se aproveitou da "indefesidão" para burlar a lei um tantinho, se aproveitando do caos de Salvador para tirar proveito de um ou outro eletrodoméstico que, com pressa e descuido, um arrombador de comércio tivesse deixado perder-se no caminho de casa ou até mesmo dentro das próprias lojas. De outro modo: é o caso de dizermos tratar-se de um cidadão transformado em ladrão, ou de um cidadão que com o caos instaurado apenas momentaneamente ladronizou-se? Ou mera oportunidade de  (que mesmo sem consciência disso) um cidadão – trabalhador-operário – ambulante – biscateiro  tomou para si aquilo que é seu e lhe é negado. Não serei eu a julgá-lo e fica aí  a questão.


E num caminho tortuoso, como a desta greve da PM BA, perdem-se às vezes, também, as estribeiras.

Muitos dos efeitos da mobilização dos senhores policiais se fizeram sentir logo de imediato:  Lojas comerciais e bancos fechados (afinal todos sabemos que é a estes que a instituição em que os senhores trabalham realmente protegem), ônibus paralisados, sentimento geral de insegurança, reação agressiva do Estado e... medo.

Medo.
 
Uma sensação que dá nas vísceras de qualquer ser humano. Um sentimento coletivo que cresceu, tornou-se pânico, pavor e morte.

Uma mobilização de uma corporação politicamente alienada, desorganizada e assumidamente reacionária. Uma mobilização completamente ilegal ( para não esquecer que o Estado Brasileiro vem se especializando em tornar crime mobilizações e contestações), com causas absolutamente legítimas, mas que fere um acordo social que está associado à manutenção da paz e do bem. Cruel encruzilhada de exus frondosos no pensamento de quem, distante, ainda que fosse na Bahia, mas refugiado em casa, atentamente observava.

X: Eita que este caminho de greve da classe policial podia desdobrar-se num golpe do destino, num revés.

Y: Já pensou se o povo, se a gente toda encontrasse um modo de se defender, assim, mutuamente, sem carecer depender?... depender?... ser dependente? Já imaginou uma segurança sem polícia, uma segurança da gentileza e da liberdade?

X: Mas como? Porquê estes manifestantes tiveram uma mobilização show business, enquanto outras classes tem intervenções fantasmas?

Y: Porque estes manifestantes carregam armas, armas legalmente portadas.

X: Poder. Um poder que tem uma origem simples: uma arma. O manifestante grita, milita, brada, reclama. O manifestante discursa, reflete, analisa rigorosamente sua prática, identifica lacunas e as transforma em propostas para o Estado. O manifestante faz greve. Tragédia, terror, caos. O manifestante, de um estado, mobiliza a imprensa do país inteiro. Mais. O manifestante mobiliza a imprensa internacional - que diga-se de passagem faz o que quer com a informação que colhe das ações do manifestante. Um estupor. Foi isso que causou, na população, o manifestante.

Y: Enquanto isso, eu, refugiado em casa, aproveitava para fazer o exercício do cuidado de si. Enquanto isso, lia a entrevista da primeira dama da Bahia para a FOLHA DE SÃO PAULO, em plena vigência greve da PM BA, revelando seus planos que pretendiam proporcionar a ela e seu esposo, o governador da Bahia, dois dias de carnaval no sambódromo do Rio de Janeiro, conferindo o desfile da Portela - que este ano homenageia a Bahia - e de outra escola de samba que terá Jorge Amado como motivo carnavalesco. Ironica contradição instituída.

X e Y: (sussurra) Mas eu cá, cultivadora de utopias que sou, espero que a médio prazo esta Greve venha a provocar  um amadurecimento político em vocês,  no trato com militantes de outras categorias que assim como vós  optam por greves, ocupação de prédios públicos e passeatas como instrumentos de luta.

UMA MENININHA SEM LETRA: (cantando) Instrumentos de luta!

X: (perguntando como um X qualquer) Como será que, a partir de agora, a polícia militar da Bahia se comportará nas rotineiras investidas em segurança que fazem em manifestações grevistas - suicidas - de outras corporações ou classes? Eis a questão. Aguardemos vigilantes e atentos.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Sina

Vivia atrás do sonho...
Corria à léguas do dano.
Quebrava os pratos de casa na parede da cozinha.
Perseguia borboletas azuis...
Descia as ladeiras cantando:
- "Já morri? Quero ressureicer."

Toda confiança

Levantou cedo.
Foi ao banco sacou toda confiança que tinha, sua senvergonhice, sua moral, sua ética e saiu apressado.
Depositou toda confiança na lavanderia.
Queria lavar e depois enxugar o pensamento
já andava com as costas doendo
de tanto carregar consciência pesada.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Tédio

E quando tudo parece quieto, calmo...
quando o tumulto cessa e é possível ouvir o canto dos pássaros...
quando a alma espera, paciente...
é sinal de que o tédio criou sua poeira verde e de que é preciso revolver a terra, ará-la, virá-la do avesso.

Santo remédio


Quero aliviar todas as minhas dores numa mijada demorada e catártica.

Deu merda!

Pelo telefone

- Puta que pariu!
- Que foi? Rolou?
- Rapaz... (Silêncio. Gargalha. SIlêncio)
- Diz logo, moço!
- Tu não acredita? Liguei pro canal, rapaz, e o cara disse que não tá repassando por falta de segurança!
- (descrente) É mesmo?! Mas...
- (cortando) Moço! Deixa eu te dizer. É que eu to na Bahia!
- É mole?

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

O DIA EM QUE A TERRA PAROU.



Naquela tarde tive um sonho :
Um vírus se espalhou, um vírus chamado medo
Pelas ruas da cidade, pairavam o molhado das chuvas, e a cidade silenciada pelos ventos que corriam sem encontrar barreiras de transeuntes
Não havia vigilância nas ruas.
Éramos livres, e dava um medo!
Medo... medo de ver a verdade.
Respirei preocupado. Sabia que não poderia continuar escondido por muito mais tempo. Sentia ser necessário ...
Lá fora circulavam lobos ou fadas? Ou nada? Como saber?
Talvez devesse eu, tentar mais sentir que entender
Uma coisa era certa.. aquela sociedade provinciana emergente se deparou com questionamentos, revoltas e... humor! Sim, humor. Humores novos. Tudo era agora um eterno inesperado.
Como num tabuleiro de xadrez, se as peças importantes se vão, menos o seu ‘rei’ estará seguro de sua maldição.
Mas agora ali, éramos todos piões diante de um imenso e desconhecido tabuleiro. Um sistema poderoso, devorador e... carismático.
Caos. Essa era a ERA vivida nas ruas, bairros e moradias, apenas desespero em meio ao que estava tranqüilo... e quieto.
De qualquer modo, em meio a cosmos, pesadelos, crenças e modas, respiramos acontecimentos e expectativas em constante movimento.

(sonhos, delírios e especulações – uma tarde com Arthur e  Ariana – sexto dia de uma greve curiosa)


domingo, 5 de fevereiro de 2012

1. CORO

Escuridão. A luz ilumina a cena, vagarosamente ao som de um tique taquear de relógio. Forma-se um coro de atores, homens, vestidos de modo uniforme (paletó preto, gravata vermelha, cueca, meia e sapatos sociais). Silêncio. Escuridão.

Luz. Sapateiam. Sons dos sapatos. Param. Silêncio. Escuridão.

Luz. Alguém canta em off um sucesso de Carmem Miranda. Nos bolsos, os atores pegam bananas. Descascam coreografadamente. Trepam com as bananas, sexo oral, usam-nas como falos. Tudo dançado. Silêncio. Escuridão.

Luz. Samba de pandeiro. Os atores sambam. Silêncio. Escuridão.

Luz. Em off, vozes de pessoas que falam de suas saudades. Nos bolsos os atores pegam batons vermelhos. Numa partitura executada com criteriosa simultaneidade entre os atores do coro, pintam: boca, círculo na barriga, olho. Silêncio. Escuridão.

Luz. Com intervalos regulares, um a um, os atores entram em cena usando headfones, dançando, cada um a seu modo a música que escutam. Parecem ouvir coisas completamente diferentes. Murmuram suas melodias de modo frágil e inconstante. Murmuram o que escutam enquanto dançam. Escuridão. Luz. Dançam juntos um curta coreografia. Silêncio. Escuridão.

Luz. Um homem apenas. Está nu e com uma maçã nas mãos. Liga uma velha vitrola, ouve-se Nina Simone (Ain't Got No). Come a maçã toda, aos poucos, degustando. Silêncio. Luz cai em resistência.

DIa D

Eis, hoje, um dia D:

Desespero
Delírio
Desejo
Deleite
Desassossego
Desritimia
Desapego
Desassuntamento
Desaforo
Desafeto
Desvelo
Desnível
Desterro
Desconforto
Desespero
Desditosa cacofonia:
Desmedida

Outra vez! - diz a plateia

Mais uma.
A última.
Derradeira e soturna apresentação pública
do clownesco poeta suicida,
que pula do culme do prédio e quica, grita, rodopia e cai.

Peralta assassino de si.

Contemplando essa desgraça,
a risonha plateia, egoísta (será?), pede bis.

- Ehhhhh!

Delírio.
O poeta, velho e trágico palhaço, tropeça e cai.
Tomba, em cambalhota rota no chão.
O poeta morre a cada respiração para fazer aquele dificílimo número.

- Ehhhhh!

Delírio.

Contemplando essa desgraça,
a risonha platéia, egoísta, em febre clama:

- Outra, outra vez, palhaço!



O clownesco poeta suicida,
que pula do culme do prédio e quica.
Pela última vez.
Quica.

dos humores

Uma performance.

silêncio.
escuridão.
um pequeno foco de luz abre-se em resistência revelando o corpo nu de uma mulher que sustenta-se apenas apoiada pelo contato de sua cabeça com a parede azulejada.
silêncio.
ela move-se vagarosamente com gestos simétricos e sinuosos.
parece querer dançar.

pousa a mão direita na parede.
estalo.
pousa a mão esquerda também.
estalo.
tum tum
tum tum
faz do concreto percussão

maracatu
coco
xaxado
baião

disritmia tanta que a taça quebra tingindo a sala.
cansada para. Cria uma expectativa para o nada.

silêncio.
luz caí em resistência.

ORAÇÃO DO DESTAMPADO

CORO: (canta) Evoé, Zagreu!

CORIFEU 1: Eis que ofereço-te ditirambos de meus ais!
Entoamos aedos e cânticos à videira.

CORO: (canta) Evoé, Baco!

CORIFEU 2: Era um líquido fechado numa garrafa,
tampado em mais profundo silêncio,
lacrado.

CORO: (canta) Silêncios inspiram magias e rituais.

CORIFEU 1: Onde está o vinho do sujeito destampado?

CORO: (canta)Lenitivo da dor
sangue da terra
adjuvante do absoluto 

CORIFEU 2: Abram-se portas!

CORO: (canta) Evoé, Dioniso!
"Eis a voz, eis o Deus, eis a fala,
eis que a luz se acendeu na casa
e não cabe mais na sala"*
Evoé!

 * Paulo Leminski.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Três Marias






Não são anjos
não são flores
nem Evas
ou Pandoras.

Feminil paisagem
Carinho aos olhos
e para além da bela paisagem que aflora
chama e poesia que se adivinha.







* Imagem 1. Fernand Leger, Three Women
* Imagem 2. Lidia Costa, Três mulheres (imagem pescada do blog: lidia costa7.blogspot.com)

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

BANQUETE 01 - DIÁLOGO COM O MUNDO

Se existisse um fundo, quais seriam então as frentes que teria o mundo?
Se existir um fundo, qual é a frente que tem o mundo?
Se existiu um fundo, qual foi a frente que te gargalhou, mundo?


- Tem coisas que se eu leio muito a coisa fica engraçada!

NA CONTRA-MÃO

Não posso ter cinzeiros em casa
Se sou cinza derrramo-me ao chão
Só posso ser eu mesmo em casa,
Quando recolho os cacos de vidro de depois da lição.

Dos crimes gramaticais

Ah! Será que dá pra perdoar um existir sem “H”?
- Põe entre aspas!

SAMBA DO BOM GOSTO

Ai meu Deus!
Ai meu Deus!
Ai meu Deus!
Esse bom gosto ainda me mata!
Ai meu Deus!
Ai meu Deus!
Ai meu Deus!
Bom gosto sem polícia, sem milícia, sem patrão

Que delícia, que delícia!
Comeria como chocolate
Que delícia, Que delícia!


Só não quero que ele me mate!

O canto deles

Acorda, poeta! A cor do poeta.
O acordo poeta.
O cordial poeta.
Meu amigo é louco.
Eu sei, mas eu deixo.
EU canto.
O canto azul lunar dos smurfs.

Correndo para jogar

TEMOS A PARTIR DE AGORA
41 MINUTOS DE JOGO
O TEMPO É CURTO.
NÃO DEU TEMPO DE FAZER O QUE DEVIA TER SIDO FEITO?

QUERO COMER O CU DO MUNDO

QUERO COMER O CU DO MUNDO
E VER LÁ NO FUNDO O QUE É QUE VAI DAR.
QUERO ATROPELAR A DANÇA,
INVENTAR (outras) NOVAS BALANÇAS
PRA PODER PESAR